A melhor resposta: o espetáculo da vida

“E não há melhor resposta

que o espetáculo da vida”

João Cabral de Melo Neto

Débora e Janice estiveram grávidas nos mesmos dias, as crias se conheceram de dentro dos ventres. José dizia para o amigo Valter: nossos filhos ainda vão se casar e nos dar um neto, sorrindo. Zezinho era menor e menos encorpado que Aline, o pai alertava que se ele não comesse não cresceria para casar com a garota. Eles cresceram pertinho, na mesma comunidade, separados por poucos metros na escola dominical.

José morreu de repente. Foi de coração. O menino ainda não estava criado. Após alguns anos Zezinho, usando o anel de seu pai, casou com Aline. Nos dias festivos reuniam-se com a família na casa da matriarca Arminda, lúcida e altiva em seus muitos anos. Ela abraçava Aline e perguntava: quando eu vou ter um bisneto? A neta sorria e dizia que chegaria o tempo.

Chegou a pandemia. Já não era possível abraçar como sempre, nem se juntar para almoçar na casa da vovó. Houve distância, houve silêncio, houve saudade.

Vovó Arminda contraiu o coronavírus, foi internada, acabou sendo admitida numa unidade de terapia intensiva. Alguns dias depois o papai Valter: aquele homem forte, que tinha um voz doce e tocava violão como ninguém, também ficou cansado, RTPCR positivo, admitido no hospital via emergência. Os dias quase não passaram para Aline com dois amores internados. Em suma: Arminda não soube quando seu filho foi internado, Valter não soube quando sua mãe morreu. Algumas semanas e muitas intercorrências depois ele também se foi. Vovó e papai, adeus.

Não havia muita cor naqueles dias de luto até que o teste veio com duas fitinhas: existia uma promessa de vida pulsando em Aline. Quando Zezinho tomou conhecimento fechou os olhos e se conectou com o seu pai: ele tinha avisado! Agora era a sua vez.

Zezinho esteve com tosse, catarro e cansaço: Covid-19 confirmada. Precisou se isolar da mulher. Ela ficou sozinha, sozinha. Após duas semanas (eternas) ele retornou com o quadro resolvido, o vírus passou longe dela.

Contrações, maternidade, dilatação, parto natural. Pedro nasceu forte, pulsante, lindo. Aline ficou extasiada, em seus braços e em seu seio cabia todo o amor do mundo. Ela olhou o seu pequeno e viu nele as promessas de vida mais bonitas. Ali viviam: as palavras de José, as músicas de Valter, os sonhos de Arminda. O choro do seu filho trazia um sinal de que a vida se impõe. Antes de pegar no sono pela primeira vez, ela abraçou o pequenino e sussurrou: bença, vovó Arminda, aqui está o seu bisneto.

No princípio era o verbo, agora chegou o tempo.